A introdução, recentemente, do VAR (vídeo-árbitro)*, no futebol, é a evidência, a visibilidade e a confirmação de que no futebol se deve medir, e se mede: a evidência mais recente de que se mede e se mede muito no futebol. E a medição é uma condição necessária para a transparência, a justeza e a justiça no futebol. (A natureza e o volume de negócios desta indústria justifica e obriga a que assim deva ser.)
Todavia, o VAR não revela publicamente tudo o que mede e potencialmente pode medir, sobretudo por não ser relevante nem necessário.
O VAR mede e revela aquelas grandezas que são relevantes para o controlo das regras no futebol, jogo a jogo. Mas outras entidades também fazem medições, com outros propósitos: por exemplo, a avaliação, pelas equipas técnicas de cada clube, do desempenho dos jogadores durante os jogos.
(O VAR não faz só medições: ajuda a revelar quem foi “o último a tocar na bola”, “quem pisou quem”, e “alerta para sanção a jogador errado”, entre outras e variadas situações irregulares. Não é só um medidor competente, mas também um observador privilegiado.)
Sendo o campo de futebol desenhado com segmentos de reta e arcos de circunferência; e sendo os trajetos da bola constituídos aproximada e fundamentalmente por segmentos de reta** (na relva) e arcos de parábola (no ar, nos pontapés de baliza, nos lançamentos laterais, nos passes aéreos, nos cruzamentos ou nos penaltis ou grandes penalidades), o futebol estaria mesmo a pedi‑las: as medições***.
As medições tornam as decisões indiscutíveis, embora pareça haver muita gente com saudades do modo antigo: a olhómetro, ou olhômetro, em brasileiro, é que seria interessante e emocionante!
(Entretanto, o árbitro, para a marcação de castigos, mede a passo a distância entre o jogador que marca o castigo e a barreira dos jogadores adversários que ficam por perto para potenciar a defesa.)
Um campo e um jogo de futebol constituem um evento festivo, memorável e único de geometria****, quer pura, quer dimensional.
* Contrariamente ao que com frequência se ouve, “VAR” não é acrónimo retirado de Vídeo‑ÁRbitro, mas é sigla elaborada com as primeiras letras das palavras da expressão inglesa Video Assistant Referee.
** Pelo menos desde Aristóteles [384 a.C. – 322 a.C.] – precetor de Alexandre o Grande, entre outras atividades ainda mais relevantes – o chuto na bola foi tema de reflexão para génios e talentos. Para Aristóteles – para quem as moscas tinham oito patas (só têm seis, basta contá‑las) e as mulheres tinham menos dentes do que os homens (a dentição é idêntica) – a bola seguiria em linha reta após ser pontapeada e depois (?) cairia a pique. Para outros, como Galileu, Newton e Einstein, mais pormenor menos detalhe, a curva seria uma parábola, ou próxima das parábolas regulares comuns: a presença de outros campos físicos, para além do campo gravítico, deformariam a “parábola geométrica”.
*** O desempenho dos jogadores de futebol poderia ser melhorado se aprendessem geometria e aerodinâmica? (Os treinadores de futebol dos escalões mais elevados, em geral, são, no mínimo, licenciados de cursos superiores; os jogadores, na sua maioria, não têm habilitações formais específicas.)
**** Que curva (ou família de curvas) será a trivela?
“Igual” e “igualdade” são termos e conceitos aparentemente simples e para os quais existe, principalmente nas ciências exatas, um sinal universalmente conhecido e usado:=.
Todavia, mesmo em áreas estritamente técnicas (Ciência incluída!), o sinal “igual” (=) e o termo “igualdade” não são, correntemente, o que se esperaria, ou o que parecem.
Em termos práticos, para sabermos se há igualdade, é preciso medir.
Na Metrologia, quando dizemos que o diâmetro da esfera “A” é igual ao diâmetro da esfera “B” (ØA=ØB) fazemos uma afirmação que em absoluto não é verdadeira: só é nominalmente verdadeira (convencionalmente verdadeira) se os diâmetros de uma e outra (esferas), dimensionalmente, não diferirem mais do que o valor da “tolerância” (imposta por quem encomenda as esferas), em composição com o valor da “incerteza” (determinada pelo sistema e método de medição).
Mesmo quando escrevemos que o comprimento, h, de uma porta, é igual (=) a dois metros, h=2 m, sem indicar a “incerteza”, estamos a afirmar só “meia verdade” *.
E o que dizer da expressão N=N+1 (que se reduz a 0=1), vista vezes sem conta em programas informáticos, ou programas de computador? (N=N+1 significa que, a partir do passo do programa onde aparece esta instrução, o valor do “N” anterior passa a ser “N+1”, isto é, tem um valor mais elevado de, exatamente, uma unidade, ou, de outro modo, o sinal “=”, neste caso, significa “passa a ser”.
A “igualdade” é conceito ainda mais complexo, ambíguo e complicado em domínios não técnicos**. (Quando alguém, alegadamente carente, afirma – A minha barriga [?] é igual à dos ricos, esquece outras partes do seu corpo que não sabe, ou não lhe convém referir***.)
* O que parece igual, quando medido com um certo instrumento, poderá passar a ser diferente se usarmos outro instrumento com, por exemplo, maior “poder resolvente”.
Além disso, por exemplo, nas carpintarias, na construção civil e nas serralharias, trabalha‑se com erros (incertezas e tolerâncias) significativamente maiores do que, entre outras áreas, na indústria metalomecânica.
** “Igualdade” é termo corrente, por exemplo, em política, ideologia e religião. É famosa a trilogia da “Revolução Francesa”: “Liberté, Egalité, Fraternité”, nunca cumprida, em particular, porque, por exemplo, a “fraternidade” não se efetiva por decreto e a liberdade e a igualdade poderão conflituar. Às vezes, o termo “fraternidade” é substituído, entre outros, pelo termo “solidariedade”.
*** A linguagem popular, por razões diversas, em geral, não é rigorosa.
A propósito da festa de S. João, no Porto, no norte de Portugal, um jornal comentava a “Preparação para a noite mais longa do ano …”. Ora, tratando‑se do solstício de verão (no hemisfério norte), será antes a noite … mais curta do ano! (Aparentemente, aquele título quereria significar que é nessa altura que ocorrem os festejos noturnos mais demorados.)
Há já alguns anos que a 20 de maio* se comemora o Dia Mundial da Metrologia. Este ano – 2024 –, a temática da celebração é “Sustentabilidade – Medimos hoje para a sustentabilidade de amanhã.”
(“Sustainability. We measure today for a sustainable tomorrow.”)
Aparentemente, a “sustentabilidade” – exatamente de quê? – não estaria garantida e já claudicaria. Contudo, em vez desta, poderia ser qualquer outra temática que aflige, ou parece afligir o planeta, ou melhor, os terráqueos, melhor ainda, alguns terráqueos, ainda melhor, alguns dos seus líderes**.
Afinal, quando é que a “sustentabilidade” foi quebrada, ou descontinuada; ou é só um problema de “agenda”, de “perceção” e … de manipulação?!)
A sustentabilidade ainda não é mensurável; e parece não haver ainda medidas da “sustentabilidade”, mas com a vontade de influenciadores e a ajuda de algoritmos – as novas ferramentas de alavancar “culturas” e tecnologias, e um palavrão de fazer estarrecer a plebe – e projeções mais ou menos proféticas – não há Civilizações nem Eras sem profetas, sem bruxas nem adivinhos –, lá poderemos chegar.
Segundo os promotores da comemoração, estariam, entre outras, as preocupações da medição da “utilização de energia nas indústrias, edifícios e transportes, a gestão de recursos na agricultura e na silvicultura, a identificação de fontes de poluição e a definição de metas para a proteção ambiental”.
(Os promotores regozijam‑se também com o reconhecimento pela UNESCO do Dia Mundial da Metrologia como Dia Internacional UNESCO***.)
Todavia, a Metrologia é instrumental e é tão útil e necessária na “sustentabilidade” como na insustentabilidade, na saúde como na doença, em democracia, como em ditadura.
(“Sustentabilidade” e “apelo ao consumo” estariam numa relação esquizofrénica difícil de resolver, todavia, muitas empresas de artefactos consumíveis fúteis já produzem “verde”, e auto‑inseriram‑se nas economias “circular”, “sustentável” e “ecológica”, entre outras atualizações convenientes.)
Quando se pretende gerir (bem) um sistema, grande ou pequeno, simples ou complexo, natural ou artificial, é indispensável medir; é incontornável o estabelecimento de metas, finais ou parciais, imediatas ou a prazo, holísticas ou específicas, sendo o controlo (que integra a medição) inseparável da gestão.
* A 20 de maio de 1875, em França, quase um século após o início da Revolução Francesa [1789 – 1799] – um turbilhão social, político e económico, que também promoveu, entre outros, o estudo, o projeto e a elaboração de um sistema de medidas unificado (Sistema Métrico), mais racional e consistente do que os quevigoravam até então e que os substituiria –, foi assinada a Convenção do Metro, de que Portugal foi um dos dezassete (17) subscritores.
** A questão dasustentabilidade (da vida da espécie humana) é debatida há dezenas de anos por grupos de reflexão informados, nomeadamente em alguns fóruns (foros, em alternativa; ou fora, em latim) científicos, e outros. Porém, só agora parece ter sido adotado como objetivo de âmbito mundial, por muitos meios e com muitos recursos.
(Algumas pessoas poderão achar no termo “sustentabilidade” uns laivos de “conservadorismo”, de “reacionarismo” e de “antiprogressismo”.)
*** This year marks the official recognition by UNESCO of 20 May each year as a UNESCO International Day. This designation opens new avenues to promote metrology, aligning with UNESCO’s mission to construct a better world through science and education.
O termo “instantâneo” é um termo “antigo” de quando se pensava, por exemplo, que a luz de uma fonte luminosa chegava a todos os pontos (onde fosse capaz de chegar) ao mesmo tempo e no instante (?) em que tinha partido, fosse longe ou perto.
(Quando não medimos – ou não medíamos – só as palavras – e as suas ambiguidades, corruptelas e corrupções – podem ser os tijolos do conhecimento, da comunicação e da memória. E enquanto as histórias em circulação encaixavam/encaixarem umas nas outras, a ciência prossegue alegremente, antes e agora.)
O que é, ou fosse, instantâneo* não necessitaria de medição: a luz, fenómeno tido por instantâneo, teria velocidade infinita, o que é hoje rejeitado completamente** por comprovadamente falso.
Contudo, designamos a velocidade que lemos no velocímetro do carro como velocidade instantânea***. A velocidade instantânea de, por exemplo, 100 km/h significa que, se tudo continuasse sem alteração, o carro, em uma hora (1 h), percorreria cem quilómetros (100 km).
(Em princípio, a designação de “velocidade instantânea”**** – num ponto, ou local – seria uma necessidade para a distinguirmos, por exemplo, da “velocidade média” entre dois pontos, ou locais.)
Embora não seja costume dizermos “potência instantânea”, em rigor, é disso que se trata, quando, por exemplo, dispara o dispositivo contador de energia elétrica sempre que ultrapassamos o valor instantâneo da potência contratada.
* Antigamente, uma fotografia era por vezes designada por instantâneo, por parecer um instante congelado de algum processo. De resto, tudo o que ocorre, indicativamente, com intervalo inferior a 0,1 s (um décimo de segundo) tende a sobrepor‑se na nossa visão, no nosso cérebro.
(Hoje, em geral, uma fotografia passou a ser uma “selfie”, mesmo que não seja um registo fotográfico do fotógrafo feito por ele próprio.)
Para alguns exegetas, o(s) desejo(s) e a(s) vontade(s) de Deus também seriam instantâneos, todos de uma só vez, e ao mesmo tempo, “fora do tempo” (humano, já agora), um estado sem início (do tempo), nem fim (do tempo).
** Com a Mecânica Quântica, parece ter voltado o “instantâneo”, contudo, aparentemente, com a rejeição, entre outros, de Einstein. Instantâneo implica velocidade infinita, e não haveria, convencionalmente (agora), nada real – em oposição ao virtual, ou imaginário – com velocidade superior â da luz.
*** Um carro que voa, como aqueles que, em atividades radicais, entre outras, se projetam no espaço após subirem uma rampa abruptamente interrompida, em modo de avião, terá o velocímetro “a zeros”. (Estes carros não costumam estar providos de instrumentação aérea!)
**** A velocidade expressa em m/µs será mais instantânea do que a velocidade em metros por segundo, m/s, ou em quilómetros por hora, km/h?
Por exemplo, 10 m/s é equivalente a
10–6/10–6∙10 m/s = (10–6∙10 m)/10–6 s = 10–5 m/µs,
isto é, dez metros por segundo é equivalente a um centésimo milésimo do metro (0,000 01 m) por microssegundo (µs), e também equivalente a 36 km/h (10 m/s=103/103∙10 m/s=10 km/1000 s=36 km/h).
Em linguagem popular, quando alguém diz que não tem “orçamento”, quer dizer que não tem disponibilidade financeira, que “não tem dinheiro”, e, em geral, nem expectativa quanto a vir a tê-lo. (Alguns que dizem “não terem orçamento”, não sabem com rigor do que se trata; outros, que usam a mesma expressão, até desconhecem a grafia da palavra “orçamento”.)
Hoje fala‑se com recursos estilísticos que, aparentemente, promovem e contribuem para a instituição de uma novilíngua, à custa de ambiguidades, erros e incorreções, embora, frequentemente, com recurso a termos clássicos de elevado tecnicismo, e, aparentemente, prestigiados, usados indevidamente, mas, com frequência, com tendência a popularizarem‑se, a normalizarem-se e a banalizarem‑se. (O povo faz a língua; os eruditos esbracejam, lá atrás.)
Para orçamentar, agora com mais pendor técnico e profissional do termo, em princípio, será necessário medir, fazer medições.
Correntemente, muitos orçamentos alicerçam‑se em estimativas, em heurísticas; umas com alguma fundamentação, outras por simples perceção. (Contudo, às vezes, a perceção é fundada em longa experiência.)
As estimativas, frequentemente, baseiam-se em medidas históricas: estimativas por semelhança, por intuição e a sentimento.
Para custear, mede‑se (ou, devia medir‑se); para orçamentar, estima-se.
Orçamentar é uma simulação geralmente aligeirada, apressada e simplificada do processo de custear. (Parte do sucesso empresarial está no rigor dos orçamentos: não frustrar clientes; assegurar lucros.)
Quanto custa a cadeira acabada de fabricar? Lista‑se os recursos, as atividades e os fatores utilizados e as respetivas quantidades. Mede-se os fatores, os recursos e atividades usados na produção (materiais, mão‑de‑obra, entre outros) e calcula-se o custo (da cadeira). De seguida, dependendo de circunstâncias, do mercado e de estratégias, e de outros custos (distribuição, marketing, comercialização, entre outros custos e fatores), estabelece-se o preço. (Nos orçamentos, correntemente, estes fatores são estimados; no custeio os fatores são medidos.)
No método clássico, para custear – determinar o custo –, por exemplo, de um produto de carpintaria, ou marcenaria, mede-se a quantidade de madeira (ou outras matérias‑primas, como colas, pregos e tintas) e de outros fatores materiais, por exemplo, consumíveis – água, lixas, entre outros materiais que apesar de usados na fabricação, não integram o produto final – e mão‑de‑obra. Adiciona‑se‑lhe outros custos: energia, amortizações de máquinas e outros recursos físicos, por exemplo, e de acordo com outros critérios e estratégias, determina-se o custo. De seguida, juntando mais custos (de gestão) e parcelas relativas a outros critérios, nomeadamente, o lucro, calcula-se o preço.
Se a alguns leitores isto possa parecer difícil, complicado e demorado, a muitos responsáveis industriais parece desnecessário, e, por isso, banalizam, estimam a sentimento, apoiados na experiência, mas sem saberem com rigor se, depois da execução e venda da obra, ganharam, ou perderam.
Medir poderá ser difícil, polémico, controverso e … tem custos! Não medir é gerir no escuro.
É corrente a gestão de um negócio através da tesouraria, isto é, através dos saldos da tesouraria. Mas isso, é equivalente a, na estrada, fazer má condução e, eventualmente despistar‑se, e em função dos resultados, corrigir o modo de condução.