Se a entropia é uma medida da desordem, a ordem depende frequentemente de medições e das respetivas medidas*.
A desordem – ou a perceção da desordem – parece ser um conceito e um princípio relativamente simples e comum. Perceber a desordem e transformá-la em ordem poderá ser o resultado de medições**.
Medir poderá ser um fator decisivo e incontornável em muitas situações.
Contudo, não é suficiente medir: é necessário sobretudo saber para quê.
Por exemplo, em culinária, são frequentes as referências às quantidades dos temperos por, entre outras unidades: a pitada, o raminho, o golpe, a quantidade abundante, a mão cheia e a gosto. Porém, as cozinhas industriais não poderão dar-se a este luxo, o luxo da subjetividade, do sentimento, do improviso, do (grande) risco de erro e falha, do toque artístico, do inesperado, da inconstância, da desordem. Embora algumas especialidades culinárias tenham tido origem em erros, desvios e … desordem.
(As nossas expectativas são mais frequentemente frustradas com a comida caseira – comida de autor?! – do que com a comida industrial!)
A criatividade – e a falta dela, juntamente com a puerilidade, arbitrariedade e incompetência mascaradas de criatividade – parece ser avessa à medida. A medição parece limitar e castrar a criação; frequentemente, a medição vem depois da criação.
Medindo, somos mais eficientes. Não medindo, temos de recorrer às tentativas e erros (que poderão integrar algumas … medições!).
Medindo, frequentemente, podemos ser eficazes e eficientes, podemos ordenar, racionalizar e normalizar.
A uniformidade e a garantia da constância só se conseguem com medições e normas, ou respeito por procedimentos pré-estabelecidos.
A Ciência – que em geral não dispensa medições – introduz ordem no conhecimento, no conhecimento mais confiável; embora nem tudo o que é por vezes anunciado como científico o seja.
A Metrologia é subsidiária e simultaneamente contribuinte da Ciência.
Comprometemo‑nos mais quando nos exprimimos com medidas, com informação objetiva e confirmável, como são as medidas.
As imposturas – por exemplo, as fraudes científicas – parecem ser mais frequentes nas ciências sociais; a objetividade é mais diluída e a falta de medidas e ausência de medições são mais impeditivos do contraditório.
Com números, com números confiáveis, como são correntemente os resultados das medições, tudo se torna mais transparente, eventualmente isento de polémica. A medição traz ordenamento intelectual e social; a medição é insubstituível, torna os processos mais comparáveis e igualitários.
As medições introduzem a habituação … à medição; as medições criam ordem.
Com medidas disciplinamos a mente e o ambiente; podemos ter mais controlo sobre o que fazemos; projetamos com mais confiança e segurança o futuro próximo.
* A matemática é a ciência da ordem e da medida, segundo René Descartes (RenatusCartesius) [1596‑1650], geralmente considerado um dos fundadores da Geometria Analítica, e de cujo nome resultou, por exemplo, a expressão “coordenadas cartesianas”, entre outras expressões que o homenageiam.
** A perceção e descoberta da ordem é que permitem e constituem, comummente, o avanço científico, entre outros avanços.
Para os humanos primitivos – ou antes, presumivelmente com os hominídeos –, os tamanhos das peças de caça, o valor dos territórios das comunidades e a magnitude das dimensões das coisas – distâncias, comprimentos, larguras, espessuras, alturas, profundidades, diâmetros (das árvores, por exemplo), envergadura, entre outros – seriam comparáveis e comparados entre si, ainda que sem um padrão ou bitola comuns, ou unidade explícita, mas exigindo avaliação*.
Como decidir, esforçar‑se, lutar, fugir, perseverar a vida e o corpo, sem avaliação (prévia)?
Aprendemos a medir o movimento (as grandezas associadas ao movimento) e as coisas em movimento: não é difícil perceber quem é mais rápido a correr; e os mais lentos tenderiam a não deixar descendência (ou a deixar menos descendência do que os outros); nem a narrar (talvez grunhindo) o acontecido.
Há movimento no crescimento das árvores; há movimento das placas tectónicas, onde assentam os continentes; há movimento de moléculas na água parada, e o movimento browniano, na superfície da água, por exemplo.
Há movimento no ar e do ar. Por exemplo, os anemómetros medem a velocidade do vento.
Os comboios, os pombos e os automóveis movem‑se (!), e hoje, comparar os movimentos destes pode ser feito com medidas e medições**.
Há várias grandezas associadas ao fenómeno “movimento”: distância, velocidade, aceleração, frequência, energia cinética, impulso, quantidade de movimento ou momentum, ou momento (linear ou angular), entre outras.
Ir do Porto a Braga poderia levar um dia; do Porto a Viana do Castelo levaria dois dias; mas chegamos mais cedo quando corremos, quando nos deslocamos mais depressa; todavia, o conceito de velocidade é recente***.
Hoje, medimos a velocidade do carro, dentro do carro – com o velocímetro – e fora do carro – com cinemómetros (radares). E podemos medir a aceleração do carro, dentro e fora do mesmo.
Medimos as velocidades das aeronaves, as dos comboios e as dos navios, cada tipo com seu critério, princípio metrológico e técnica.
Pesamos o comboio em movimento; pesamos a Terra e a Lua (que ainda não deixaram de se mover) e ocorreu a Arquimedes medir o volume de uma coroa quando ele próprio mergulhou numa banheira.
Media‑se a temperatura antes desta ser definida termodinamicamente (a partir das grandezas “entropia” e “energia”).
* Até os gatos, entre outros animais, antes de um salto, calculariam o impulso depois da avaliação do tamanho do obstáculo, intervalo, ou espaço a vencer.
E a decisão de um predador selvagem de atacar ou não uma eventual presa implica a avaliação do tamanho da mesma (presa).
** Até (ao tempo de) Galileu, dizia-se – diziam os sábios (uma palavra em desuso) – que os graves (os corpos que se movem por efeito da gravidade) caíam todos com a mesma velocidade, isto é, a velocidade constante; na verdade, caem todos com a mesma aceleração.
(É possível, com tempo, verificar se o que dizem os sábios é crível, sustentável e consistente. Ao contrário, os mensageiros de Deus, em geral, não correm risco de desmentido.)
*** Um fulano a quem a namorada disse precisar de tempo e distância perguntava a si próprio se ela estaria a calcular alguma velocidade.
O termo “força” é muito comum, em vários domínios; o termo “esforço” parece menos corrente. E o termo “momento”, com o significado de grandeza mecânica (torque, esforço para fazer rodar), é usado quase que somente por alguns profissionais relacionados com Engenharia e Tecnologia Mecânicas.
As “forças” são medidas, por exemplo, com dinamómetros*.
Os “momentos” são medidos, por exemplo, com chaves dinamométricas.
“Esforço” é termo que, tecnicamente, engloba, quer “forças”, quer “momentos” (mecânicos).
A unidade de força SI é o newton, N: uma pessoa que pese, ou tenha massa igual a setenta quilogramas (70 kg) pesará, fará uma força, por exemplo, sobre um navio, de quase setecentos newtons (70 kg×9,8 m/s2≈700 N).
A unidade de momento SI é o newton-metro, N∙m; o aperto/desaperto de uma porca de roda de um automóvel poderá ser, indicativamente, de 50 N∙m.
A linguagem corrente e comum está cheia de termos que só têm significado inambíguo em Ciência, por exemplo, em Física. Todavia, muitos termos usados em Ciência foram tomados da linguagem corrente, embora também ocorram migrações lexicais em sentido contrário, da linguagem corrente para a linguagem técnica (e científica).
Numa manifestação de rua, ou numa arruada, o líder (político) poderá gritar repetidamente, qual mantra, litania ou ramerrame: assim se vê a força do PT; do PP; ou do PD, consoante a sigla do partido, embora nem todos com a mesma convicção, força e energia.
Por exemplo, a expressão “relação de forças”, entre países, entre partidos, entre “economias”, entre um número indeterminado de expressões idênticas, quer significar “relação de poder” (ou relação de outros quantificadores comparáveis); a palavra “poder” parece ser menos ambígua em campos políticos, sociais, e económicos do que o termo “força” que parece ser indicador de coisa pressentida, ou percecionada, mas não mensurável (nem medida em newtons).
Também falamos em “gastar as forças todas”, como se “força” fosse coisa armazenável e consumível. Contudo, quando a uma pessoa em cima de uma cadeira se junta outra com o mesmo peso (e peso, ou massa) da primeira, duplica a força sobre a cadeira.
Todavia, “força” é só um conceito – embora utilíssimo, e agora incontornável –, coisa que nunca alguém tenha visto, ou fotografado, mas que todos terão já sentido muitas vezes e de vários modos.
Por exemplo, chamamos “força” à ação que exercemos sobre um móvel para o remover do local onde repousa (quer ele se mova, ou não). Também podemos fingir que “fazemos força”, sem que “façamos força” alguma.
Nem sempre se verifica contacto (material) para a existência de uma força: por exemplo, a força que dois magnetes, ou ímanes, próximos, exercem entre si.
* As balanças comuns, correntemente, são dinamómetros, mas graduados em unidades de massa: o peso, P (P=mg), de um corpo colocado numa balança, é indicado na graduação ou escala (da mesma) através de “m”, a massa, já que “g”, a aceleração gravítica, é a mesma para todos os corpos colocados sobre esta balança, desde que a mesma (balança) opere em zona geográfica não muito grande, sobretudo em altitude.
Todavia, frequentemente, as forças são medidas (indiretamente) sem necessidade de dinamómetros, só a partir dos efeitos que elas produzem; por exemplo, no alongamento de algum elemento de que se conhece o comportamento (geométrico) quando submetido a forças (extensómetro).
Quanto mais trabalhamos e mais ganhamos, mais imposto(s) pagamos.
Quanto mais longe vamos, mais somos taxados, seja através dos impostos sobre o combustível consumido, seja pelos impostos diretamente ligados aos preços dos “bilhetes” quando somos transportados por outros.
Grande parte dos impostos (mais as taxas e as contribuições) é cobrada e paga de acordo, por exemplo, com as quantidades transacionadas, ou um mixing (mixagem, mistura) de grandezas quantitativas. Por exemplo, o IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) é proporcional ao preço e o preço, em geral, está correlacionado com os custos e estes são proporcionais às quantidades dos fatores de produção.
Em alguns casos, como, por exemplo, no caso da energia elétrica, não há proporcionalidade entre o IVA (sobre o valor da fatura) e a quantidade de energia elétrica* que consumimos, mas é a medida da energia consumida que constitui o fator da parcela mais relevante daquele imposto**.
Na fatura da energia elétrica pagamos IVA sobre serviços, como por exemplo, o serviço de contador, e taxas para vários organismos***.
Mas, não só a eletricidade (uma commodity) está sujeita a impostos; a pluviosidade em cada região poderia penalizar os residentes****!
Os impostos, onde predomina uma grande arbitrariedade (por exemplo, o IVA: 6% para produtos culturais, incluindo a pornografia; 13% para alguns produtos correntes; 23% para o vinho, entre muitos outros), fundam-se em métricas e metrologias, “unidades de conta” e unidades de medida (três quilogramas de batatas pagam o triplo de IVA do que paga um quilograma das mesmas batatas).
* Quando Faraday [1791‑1867], um físico e químico experimentalista inglês, investigava o “fenómeno eletricidade”, o ministro das finanças de então (o ministro varia com a versão da história) ter‑lhe‑á perguntado que utilidade teria aquilo (a eletricidade) – É grande a probabilidade de que Vexa. venha a taxá‑la brevemente –, ter‑lhe‑á respondido Faraday.
** Há um mercado muito conhecido, em Belém, no Brasil, o mercado “Ver‑o‑Peso” (no princípio designado “Haver o Peso”), que recebeu tal designação por que era a partir das pesagens que se calculava o imposto devido. (Provavelmente não seria caso único, nem sequer o primeiro.)
*** Muito interessante, é a taxa cobrada (às empresas) na fatura das telecomunicações – para os municípios – pela utilização do espaço do município; contudo são os privados, os munícipes (ou a sua maioria), os faturados, os cobrados, que suportam (além das taxas) as infraestruturas (postes e outros dispositivos) que atravessam os seus terrenos!
**** Em 1441, o príncipe Munjong, filho do rei coreano Sejong, teria inventado e padronizado um pluviómetro de que foram feitas várias cópias que foram enviadas para todo o território dominado pela dinastia Joseon, como uma ferramenta oficial para a recolha de … impostos, com base no potencial de colheita que cada área fértil poderia proporcionar.