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Medidas e medições para todos

Crónicas de reflexão sobre medidas e medições. Histórias quase banais sobre temas metrológicos. Ignorância, erros e menosprezo metrológicos correntes.

Medidas e medições para todos

Crónicas de reflexão sobre medidas e medições. Histórias quase banais sobre temas metrológicos. Ignorância, erros e menosprezo metrológicos correntes.

MEDIR? NEM TUDO

MEDIR? NEM TUDO

Sem meio-termo: tudo ou nada

 

Bebeu? Está bêbedo/bêbado, ou não?! Sim, ou não? Tudo, ou nada.

Parece não haver definição oficial, legal, de bêbado (o álcool não afeta todos e cada um por igual), mas pode ser medida a alcoolemia no sangue de uma pessoa e estabelecer‑se, arbitrária, mas formal e legalmente, valores para os quais são aplicadas coimas, ou imputados crimes.

Estar ou não estar bêbado pareceria ser uma questão de “sim” ou “não”, de “um” (1), ou “zero” (0), valores de uma variável booleana. A etilização (alcoolemia?), contudo, poderá ser uma grandeza contínua, objeto de medição; a alcoolemia é uma grandeza mensurável, contínua.

Como poderia ser cara(c)terizado o estado, o nível, a intensidade de uma bebedeira (enquanto variável contínua)?: pelo nível de consciência (?)?!; pela velocidade de resposta, ou pela reação a estímulos?!; pela consistência e sustentabilidade nas reações?!, ou pela taxa de alcoolemia?!, entre outros estados, comportamentos, grandezas. (Em alguns países são adotadas combinações de critérios para decidir contraordenações a aplicar a condutores eventualmente etilizados.)

Poderá algo parecer mensurável, mas, muitas vezes, ainda não é prático, nem razoável, nem aceitável, nem ser adotável a medição como critério único.

Há processos e fenómenos em que (ainda) não é possível, ou não é clara, evidente e incontestável a gradação, variação, ou mudança de valor de algumas grandezas com eles relacionadas: parecem ser processos de tudo ou nada; um (1), ou zero (0) (grandezas/variáveis booleanas); cara(c)terísticas binárias, como, no tribunal, frequentemente pretendem os juízes: sim, ou não?

 – Não há meio-termo, é o que costumamos dizer quando não percebemos mais do que “sim” ou “não”; “1”, ou “0”.

Por exemplo, a maioria de nós estaria convencida de que o género (masculino; feminino) seria uma variável booleana (só com dois valores: M;F); eis senão quando nos dizem ser uma variável discreta (não será contínua?!) com um número determinado (?) de valores. E, para cada indivíduo, estes valores seriam (ainda) dinâmicos e variáveis, consoante o seu estado de espírito, a sua vontade, ou o seu humor, entre outros fatores.

O género, coisa aparentemente distinta de sexo (embora as pessoas ainda não estejam a ser descritas pelas duas cara(c)terísticas, sexo e género), segundo as ciências de que se servem a cultura, a política e os media, apresentaria uma gradação de dezenas de valores, quase numa escala contínua, desde o “agender” até onde a imaginação permite e cientistas – não há “carteira de cientista”, como, por exemplo, as de advogado, engenheiro, ou médico – instituem (e, às vezes, desinstituem).

Há sistemas de iluminação de “tudo ou nada”, “aceso ou apagado” – os clássicos e correntes sistemas de iluminação, entre outros sistemas elétricos. Em outros (sistemas elétricos) é possível “regular” a intensidade da iluminação.

Nos sistemas tradicionais, a lâmpada (elétrica) está acesa, conservando a potência de iluminação, ou, alternativamente, está apagada. Contudo, em muitos sistemas de iluminação novos é possível regular (continuamente) a intensidade luminosa do sistema de iluminação, de mínimo a máximo.

Mas, ainda há muitos mais sistemas de tudo ou nada: as buzinas dos carros, as reações neuronais e, por exemplo, ser (ou não ser) doutor.

E até a corrupção seria gradativa: da corrupçãozinha – por exemplo, a “cunha” – à corrupção escandalosa que é notícia mediática em vários órgãos dos “media”, por tempo indeterminado.

 

2021‑03‑25

PERCEÇÃO DE MEDIDAS

PERCEÇÃO DE MEDIDAS

Medidas instrumentais

 

Em alguns “sítios” (da Internet) onde se pode consultar o estado do tempo (meteorológico), o leitor poderá deparar-se, por exemplo, com a informação de que a temperatura local atual é 18° (18° em vez de 18 °C), mas, no mesmo “sítio”, poderá estar a indicação, ou a informação de que a perceção (ou sensação) poderá ser de 17° (17° em vez de 17 °C)! Há uma leitura de temperatura atmosférica e há também previsão de … perceção de temperatura!

Poderá haver duas medidas, uma real, instrumental, objetiva, e outra/as percebida/as (mas quantificada/as!), subjetiva/as, para o valor de uma grandeza*?

Os gregos (?) – Protágoras, o grego que fez a declaração – já haviam declarado que “O homem é a medida de todas as coisas”**. Isto é, o “homem” seria – deveria ser – a bitola, a referência, o padrão para tudo.

De resto, há vários termos correntes que pressupõem a perceção das medidas: sopesar, aquilatar, avaliar, entre outras.

Já houve quem se abalançasse a tentar legitimar as determinações elaboradas pelos sentidos, isto é, a capacidade de os sentidos fazerem medições.

Weber (Ernst Heinrich Weber [1795–1878], médico alemão) parece ter sido o primeiro a ter sucesso na investigação da capacidade dos sentidos humanos perceberem (sem ajudas metrológicas, mas após treino, ou experiência) alguns aspetos da quantificação (da variação da intensidade) de grandezas físicas***.

Todavia, essa capacidade estaria limitada à perceção da variação relativa (e não absoluta) das intensidades das grandezas, dos valores das mensurandas.

 

* “Sensação térmica ou temperatura aparente é a forma como os nossos sentidos percebem a temperatura do ar, e que pode diferir da temperatura real.”

E a perceção é quantificável? E igual para todos?! Todos e cada um com a mesma perceção quantificada?!

Que confiança, que utilidade e que legitimidade podemos atribuir às perceções (nossas e alheias) dos valores das grandezas? As perceções valem em tribunal?; valeriam em domínios técnico e científico?

Na verdade, não é por lermos no termómetro que a temperatura é de 8 °C que corremos a comprar um calorífero, mas fazemo-lo por sentirmos frio.

Uma perceção não é uma medição, mas poderá ser uma avaliação, ou adivinhação (mais ou menos) quantificada, presuntivamente confiável, mas certamente de baixa reprodutibilidade.

 

** “O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquanto não são.”

Protágoras (não confundir com Pitágoras!) não estaria a pensar numa métrica, nem numa referência ou bitola, mas em comportamentos, em harmonia e convivialidade, pari passu com a subjetividade, o relativismo e a diversidade; cada homem, uma bitola!.

 

*** De um modo geral, e para referir só um tipo de sensação: se, sopesando uma massa de 500 g ela for aumentada e só percebermos que é diferente (da primeira) quando atinge 550 g, então, partindo de uma massa de 1 kg, se progressivamente for aumentada só perceberemos a diferença quando atingir 1,1 kg. Isto é, só somos sensíveis às mudanças, ou variações relativas, e só a partir de um limiar (de diferença) percentualmente constante: (1100 g‑1000 g)/1000 g=(550 g‑500 g)/500 g=0,1⇔10%. (10%⇔10/100=0,1)

 

2021-03-18

MEDIÇÕES NO FUTEBOL …

MEDIÇÕES NO FUTEBOL …

… e falta de medições

 

Tanta coisa medida* e mensurável no futebol – geometria em movimento, segundo Du Sautoy, um conhecido matemático –, e tanta coisa por medir!

O campo (de futebol) é um retângulo, em geral relvado, cheio de medidas (especificações), com corpos em movimento, posições e movimentos escrutináveis, e alguns escrutinados!

E os “tempos”, principalmente os “tempos de desconto” (ou de compensação), no fim da primeira e segunda partes de cada jogo, aparentemente estabelecidos de modo arbitrário (pelo árbitro! – quem mais?!), embora, com frequência, sejam determinantes dos resultados finais.

Até as equipas, os grupos de “jogadores em campo”, se posicionam de acordo com esquemas de jogo, aparentemente com um lugar para cada jogador (por exemplo 4‑3‑3) e cada jogador (nem sempre) no seu lugar.

Contudo, o (mundo do) futebol está cheio de problemas porque são muitos os escrutinadores, o escrutínio é apertado, constante e necessário, mas nem sempre suficiente, pela variedade de fatores em jogo, pelo seu dinamismo, e pela quantidade e estado de alma dos observadores, bem como dos ângulos de observação.

Algumas penalizações dos jogadores dependem da intensidade do contacto. Mas, que intensidade? A “intensidade” que é avaliada arbitrariamente pelo … árbitro!

Um “fora‑de‑jogo” (antigamente uma falta frequentemente polémica), querendo‑se, e podendo‑se, seria, e parece ser, em princípio, uma questão metrológica (mas problemática se os sistemas metrológicos de ajuda não estiverem calibrados – e ajustados).

Em alguns países, e em alguns jogos de futebol, já há o VAR, o Vídeo ÁRbitro, para (munido de tecnologia), entre outros objetivos, tentar diminuir os erros, por exemplo, quanto a “foras‑de‑jogo”, ultrapassagem de certas linhas pela bola e comportamentos e atitudes não admissíveis e “ilícitas” dos jogadores, mesmo que pareçam não intencionais. Mas, o VAR nem sempre mede; e, mesmo com VAR, a confusão parece continuar instalada. Medisse tudo o VAR e outro galo (golo?) cantaria.

Os jogadores sobem e descem, dizem os relatadores, mas o campo é horizontal!

Uns descem pelo lado direito enquanto os adversários, pelo mesmo lado, em sentido contrário, também descem (não deveriam subir?), mas “pela esquerda”!

As áreas dos campos e outras características geométricas das suas partes, linhas e distâncias estão racionalizadas e normalizadas.

As bolas, “áreas” e balizas, entre outros itens, são objeto de normas, requisitos e especificações. Incluindo sobretudo especificações metrológicas**.

Todavia, a julgar pelos estados de alguns campos, parece não haver especificações para a planeza – uma característica geométrica, especificável e controlável, como, entre outras, a redondez, a linearidade, o paralelismo e a horizontalidade – e a dureza do piso. Também há especificações para a altura da relva (22 mm a 25 mm).

 

* “Ronaldo: costas paralelas ao chão, a 1,41 m de altura, com a ponta do pé a 2,38 m, disparando a bola a 72 km/h para a distância de 11 m.”

 

** ”Metrológico” significa que é do âmbito das medições (obtenção experimental dum ou mais valores) e das medidas. O chamado sistema de unidades de medida inglês, que não integra o metro, é um “sistema metrológico”, mas não um “sistema métrico”, nem, apesar da unidade de base “polegada”, um “sistema polegadológico”.

 

2021‑03‑11

MEDIR A ÁGUA

MEDIR A ÁGUA

Medir com a água

 

A água é a substância (não elementar) mais comum entre nós*, ainda que seja escassa em muitas regiões (habitadas).

A água – tal como o ar –, até há pouco tempo, não era (industrialmente) processada e era gratuita, e isso justificava que, em geral, não fosse medida.

A água da chuva, por aqui e por agora, é gratuita; a água canalizada, engarrafada e de outro modo acondicionada, não, não é gratuita. Grande parte da água que nos disponibilizam é um produto industrial (a água pura é rara!) e isto obriga a especificações e medidas inerentes aos produtos industriais.

Sendo a água tão essencial à vida (humana), tão comum e com tantas utilizações (comuns e incomuns), compreende‑se que sejam medidas tantas grandezas relativas à mesma (água)**, dependendo contudo do uso e aplicações: do pH ao conteúdo mineralógico, dos solutos às suspensões, da incorporação iónica à microbiológica.

A água, pela utilidade, e pelas anomalias (físicas) relativamente a outros líquidos, vale bem umas dúzias de medições.

Todavia, muitas medidas relativas à água diriam respeito à água pura – uma raridade. Contudo, em muitos casos, as medições da água dizem respeito à água “não pura”. De resto, muitas das medições destinam‑se a determinar o seu grau de impureza/pureza, isto é, o afastamento das características de uma determinada amostra de água relativamente a referências normais da água‑padrão (água pura), seja o pH, a condutividade elétrica, os teores de sais, entre um número indeterminado de grandezas e de medições. Por exemplo, quase que só a água pura (uma raridade!) – e não a impura –, é eletricamente não condutora.

Podemos medir‑lhe, por exemplo, as temperaturas (normais, isto é, à pressão normal) de congelação, de ebulição e do ponto triplo.

A temperatura a que ocorre (à pressão normal) a massa volúmica máxima da água (cerca de 4 °C) era importante, por exemplo, para a definição da unidade “litro”, quando a definição de “litro” ainda não tinha sido feita equivalente ao “dm3”. (O litro, agora, é mais pequeno do que antes da equivalência ao “dm3”.)

A água tem propriedades extraordinárias: ebulição, um fenómeno pouco comum; massa volúmica máxima a uma temperatura particular (à pressão normal) da fase líquida: cerca de 4 °C.

A água é também uma substância de base para o estabelecimento de padrões e referências metrológicas***.

 

* Nós próprios incorporamos (no nosso organismo), ou somos, cerca de 70 % de água.

 

** Há uma grande quantidade de instrumentos de medição e de registo relativos à água, nos seus estados correntes. Entre outros dispositivos há os que têm na sua designação o prefixo hidro-, por exemplo, hidrómetro, hidrotacómetro, hidrante; ou o prefixo higro-, por exemplo, higrómetro, higróstato, entre outros termos geralmente relativos à água, como pluviómetro.

Há também o hipsómetro que se usa na determinação da altitude, a partir da temperatura a que a água entra em ebulição (≈100 °C à altitude de 0 m).

 

*** A densidade relativa de elementos, substâncias e misturas, é frequentemente referida à água. Como a massa volúmica da água é 1 g/cm3 (a cerca de 4 °C), qualquer razão de outra massa volúmica pela da água exprime‑se (em condições normais de pressão e temperatura) pelo mesmo número (mas adimensional) da massa volúmica. Por exemplo, sendo a massa volúmica do cobre 8,96 g/cm3, a sua densidade (relativa) será 8,96.

 

2021-03-04

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