Por vezes é mais interessante apresentar as variações das mensurandas (mensurandos, em brasileiro), melhor, as variações das medidas, em termos de valor absoluto, outras vezes percentualmente.
Aumentar 5 kg ao peso de algo, será muito ou pouco? A questão não é metrológica, mas comunicacional.
Aumentar 5 kg a um objeto que pesa 10 kg é aumentar 50% ao seu peso; aumentar 5 kg a algo que pesa 100 kg consiste em aumentar‑lhe 5% ao peso.
Seria ridículo dizerem‑nos – talvez os média* (“media”, mídia) –, que uma empresa admitiu mais 100% de funcionários e outra só admitiu mais 10% de trabalhadores quando a primeira (uma microempresa) passou de 1 para 2 e a segunda (uma média empresa) passou de 100 para 110! Afinal, quem duplicou a força de trabalho (100%) admitiu um só colaborador, e quem recrutou só 10%, proporcionou emprego a mais dez pessoas!
Quando se pode e quando não se deve recorrer a percentagens**?
Uma percentagem, por definição, seria a razão da dimensão de um subconjunto (por exemplo, 4 jogadores de futebol) num determinado conjunto (por exemplo, de 100 atletas) pela dimensão deste conjunto, multiplicada por 100 e a junção do símbolo %: 4/100=0,04→0,04∙100∙%=4%.
Mas, o conjunto de referência nem sempre tem cem (100) elementos. Se, no caso acima, em vez de cem (100) atletas houvesse oitenta (80), a percentagem de futebolistas naquele grupo seria 5%.
E se o grupo tivesse só sessenta (60) atletas, ou trinta (30), seria sempre legítimo calcular e apresentar a percentagem?
Em princípio, deveríamos informar quem lê as nossas percentagens, que se trata, por exemplo, de 4 em 80 (20%); ou de 18 em 150 (12%); 3 em 30 (10%), dando ao leitor mais informação para ele próprio avaliar se seria ou não seria aceitável a representação por percentagem.
Durante um determinado período contou-se o número de acidentes com veículos motorizados e constatou-se que 25% dos condutores envolvidos (quantos eram?) estavam alcoolizados (?); isto significa que 75% dos acidentados não tinham bebido álcool?!
Sem sabermos qual a percentagem de acidentados alcoolizados de entre todos os alcoolizados que conduziam naquele período, e a percentagem de sóbrios acidentados entre os sóbrios que conduziam (naquele período) não deveríamos tirar conclusões. Aparentemente, toda a gente crê (alegadamente de modo correto) que um alcoolizado tem menos competência (temporária) para conduzir do que um não alcoolizado; poderá ser verdade, mas não é possível deduzir esta conclusão a partir das percentagens supra! (Antes pelo contrário: a percentagem de alcoolizados entre todos os acidentados é inferior à dos sóbrios!)
As estatísticas prestam‑se frequentemente à manipulação de ouvintes e de leitores. E quando não há manipulação, é o próprio leitor ou ouvinte que, muitas vezes, se enreda nas estatísticas.
* “Com estatísticas e bolos se enganam os tolos” poderia ser a adaptação de um conhecido ditado popular.
** 100 g de álcool no vinho de uma garrafa de 75 cL é muito, ou pouco?
Tomando a massa volúmica do álcool como sendo 789 kg/m3=789 g/dm3≡789 g/L=789 g/1000 mL, isto é, 100 g/126,7 mL.
E 126,7 mL de álcool em 750 mL de vinho dá aproximadamente 0,169, ou 16,9%.
Medem-se o lento e o rápido, o pequeno e o grande, o leve e o pesado, o sólido e o gasoso, o céu e a Terra, os mares e os continentes, o visível e o invisível.
Medem-se as velocidades de crescimento das árvores e das unhas, e as velocidades da água e do vento*.
Medem-se distâncias entre átomos e o comprimento do eixo maior da órbita de Úrano (melhor do que Urano); medem‑se as velocidades de deriva dos continentes e a velocidade de Mercúrio à volta do Sol; mede‑se – muito recentemente! – a velocidade no movimento browniano, que Einstein** disse não poder ser medida (aparentemente, no tempo dele).
Mede‑se a velocidade de expansão do Universo, melhor, a taxa de expansão do Universo (imaginem o afastamento de pontos marcados na superfície de um balão de borracha a encher): cerca de 74 km/s por cada milhão de parsecs: 74 (km/s)/Mparsec; 1 Mparsec (um milhão de parsecs) equivale a uma distância de cerca de 3,3 milhões de anos‑luz.
São medidos os continentes; e são medidas grandezas dos movimentos dos continentes. São medidas as velocidades de deslocamento das placas tectónicas onde assentam os continentes.
Os montes da Lapónia, na Escandinávia, (ainda) sobem um centímetro (1 cm) por ano, a recuperar do peso do gelo que desapareceu de cima deles, há cerca de dez mil (10 000) anos (sem culpa dos humanos e das suas tecnologias). Um centímetro (1 cm) é também o desvio (erro) da largura do vão de uma porta, feito por artistasda construção civil, quando se compara a parte superior do vão com a parte inferior, hoje, em muitos locais de Portugal!
Se é uma grandeza física, ou de algumas outras naturezas, é potencialmente mensurável; e se ainda não se mede, um dia medir-se‑á.
Os continentes, quais placas à deriva sobre um gel, movem‑se, indicativamente, à velocidade média do crescimento das nossas unhas: em geral, à volta de dois a três centímetros por ano (2 cm/ano a 3 cm/ano).
Mede-se as marés do mar e as marés da terra (montanhas, por exemplo). Umas e outras podem ser medidas, embora as primeiras, as marítimas, há mais tempo e com maior facilidade pela sua visibilidade e maior amplitude.
Nunca ninguém viu, a olho nu, ou sentiu, as marés terrestres, mas que as há, há. E já são medidas!
As marés são dinâmicas e às marés marítimas sobrepõe-se a agitação das ondas; elas são registadas em muitos locais, por marégrafos.
As montanhas sobem e descem, como as águas do mar que estão sujeitas às marés. Mas, estes movimentos (das montanhas) não são visíveis a olhos humanos.
Uma maré, no mar, poderá ser de cinco metros (5 m); uma maré terrestre poderá atingir, em muito raros sítios especiais, parece, cinquenta centímetros (50 cm=0,50 m).
Medimos a velocidade de um carro, em geral, com cinemómetros (do lado de fora). Mas também medimos a velocidade do mesmo (carro) integrando nos seus sistemas um velocímetro (do lado de dentro).
* O movimento já foi atributo indiciário de divindade por perto: por exemplo, Éolo era (é?), para alguns, o deus (ou o guardião) dos ventos.
** Curiosamente, “ein stein” significa, ou traduz-se por, “um calhau”.
No cinema, as traduções* e as legendas, por exemplo, de medidas, poderão ser – entre outras perspetivas –, divertidas.
Não só no cinema, mas em outras artes narrativas, de entretenimento ou outro fim, as traduções poderão ser questionáveis e questionadas.
No cinema, o rigor metrológico poderá ser um disparate risível. Por exemplo, traduzir a expressão de um/uma personagem que referiu uma distância (estimada, aproximada, indicativa) de dez milhas por 16,093 4 km**, ou até 16,09 km, é despropositado e ridículo.
Não só nos filmes, mas nos documentários e em outras artes em que é necessário traduzir medidas expressas em unidades de diferentes sistemas metrológicos, ou diferentes unidades, ocorrem episódios anedóticos.
Num documentário, ou estória ficcionada, quando alguém diz “Buy one hundred pounds of silver”, como sugestão de investimento, ou armazenagem de um metal nobre, não deve ser tomado à letra e traduzido como “Compra 45,359 237 kg de prata”***.
“Inch to inch”, uma expressão idiomática não estritamente metrológica, tanto poderia ser traduzida (literalmente) por “polegada a polegada”, por o termo “polegada” ser conhecido e comum em português, mas também não haveria erro, ou despropósito, em traduzir por “centímetro a centímetro”, ou até “palmo a palmo”, por ambas as expressões serem correntes e idiomáticas**** e igualmente compreensíveis em português.
Mas “acre” (≈4047 m2), unidade de área corrente entre anglo-saxónicos, não pode ser traduzido por hectare (ha, 100 ares, 10 000 m2); um hectare “vale” cerca de duas vezes e meia (2,5) um acre, isto é, 1 ha≈2,5 acre.
As dificuldades aumentam com a tradução de, por exemplo, expressões do consumo de combustível de veículos, como “30 miles to the gallon”: a milha (unidade de comprimento) e o galão (unidade de capacidade, ou volume) não são unidades SI, nem correntes em Portugal e, por cá, não usamos o indicador km/L (o equivalente SI), mas L/km, o recíproco, melhor, cL/km, centilitros por quilómetro, ou o número de litros (L) consumidos por cada cem quilómetros (100 km) percorridos para referir o consumo de um carro.
* ”Traduttore, traditori” (“o tradutor é um traidor”, ou, ”traduzir é trair”), dizem alguns italianos.
Contudo, nem sempre o problema é de natureza literária, linguística, ou idiomática, mas de competência (ou falta da mesma) do tradutor.
O autor recorda-se de ver, num “filme de guerra”, a expressão “the General Staff” ser traduzida nas legendas como “o General Staff” – como se fosse alguém com a patente de general – em vez de “o Estado Maior”. E, em outros casos, “Army” aparecer traduzida por “Armada” (ou “Marinha”) em vez de “Exército”!
** Uma milha (terrestre) vale 1,609 34 km. Uma milha náutica corresponde a 1,852 km.
*** Uma libra (massa, ou peso) equivale a 0,453 592 37 kg.
**** “Idiomático” significa que não pode (não deve) ser traduzido literalmente, palavra a palavra, sob pena de ridículo.
“It´s a piece of cake” é corrente e corretamente traduzido (em português de Portugal) por “é canja”; “are you pulling my leg?” corresponde, à expressão portuguesa “está(s) a gozar comigo?”.
“Ao segundo” é uma expressão corrente, popular e frequente.
Esta expressão é usada geralmente para referir a programação e execução de um plano com marcos temporais de intervalos curtos.
“Ao segundo” é uma expressão que também se refere, por exemplo, a vários tipos de tarifários, como os das comunicações.
Quase todos sabemos e sentimos o que é um “segundo”: indicativamente, é o tempo que medeia entre dois batimentos cardíacos humanos consecutivos, regulares e normais*.
O “segundo” é também o intervalo de tempo que um pêndulo de cerca de um metro (1 m) de comprimento leva de um extremo ao outro da oscilação, batendo “segundos”, isto é, um pêndulo com período de dois “segundos” (2 s).
A definição “SI” da unidade “segundo” é muito mais científica, exata e prosaica: é a duração de 9 192 631 770 períodos da radiação correspondente à transição entre dois níveis hiperfinos do estado fundamental do átomo de césio 133.
No princípio, o “segundo” era uma unidade derivada da hora; agora, a hora é uma unidade derivada do “segundo”!
O que podemos fazer num “segundo”? Se, a pé, fazemos 5 km/h, fazemos cinco mil metros por hora (5000 m/h, 5000 m/3600 s), cerca de 1,4 m/s, cerca de um passo romano** por “segundo”.
Se, de carro, fazemos 120 km/h, 120 000 m/h, 120 000 m/3600 s, cerca de 33,3 m/s, o que seria possível pensar, fazer num “segundo”, quando se percorre 33 m?
Em um “segundo” poderemos fazer várias centenas de milhares de frames (fotogramas) com alguns sistemas de produção de imagens***.
Acima do “segundo” (s), principalmente acima de sessenta “segundos” (um minuto, 1 min), não usamos múltiplos decimais do mesmo “segundo”, mas sim números complexos, por exemplo: 10 h 32 min 14 s (em vez de 37 934 s)****.
* Contudo, Einstein, que instituiu o espaço-tempo – substituindo o espaço e o tempo como entidades autónomas por uma só entidade, o espaço‑tempo, deformável, qual gel – terá dito que o tempo é uma ilusão.
** Um “passo” (romano) – antiga unidade de medida de base de comprimento – correspondia à distância entre a pegada de um pé e a pegada seguinte do mesmo pé. A milha (romana, terrestre, antiga), mil passos, corresponderia a 1418 m e cada passo valeria 1,418 m.
As milhas romanas eram assinaladas nas estradas por marcos; marcos … miliários.
*** Há câmaras que podem fazer até 1 400 000 fps (frames per second)!
**** Abaixo do “segundo” usamos submúltiplos (decimais) SI do mesmo (“segundo”), por exemplo: 0,1 s (um décimo do “segundo”); 0,24 s (vinte e quatro centésimos do “segundo”); 0,789 s (setecentos e oitenta e nove milésimos do “segundo”).
Acima do “segundo”, continuamos a usar as unidades tradicionais, dificilmente descartáveis: o minuto, a hora (um e outra múltiplos sexagesimais do “segundo”) e o dia, e outros múltiplos correntes e tradicionais da linguagem comum.