Quem é que não sabe o que são “longas‑metragens” e “curtas‑metragens”, mesmo não sendo cinéfilo?!
Literalmente, metragem é a medida, ou medição, em metros.
Como milhagem é a medida, ou medição, em milhas.
Quilometragem é a medida de uma distância expressa em quilómetros, por exemplo, a distância (acumulada, ou total) já percorrida por um carro “usado”, ou em uso.
Metragem é uma palavra nova, vem de metro*, uma criação recente, uma palavra de vida ainda curta e de que deriva o termo metragem.
Metragem é também, correntemente, uma palavra associada ao cinema: longas‑ e curtas‑metragens. Mas, não se usa somente no jargão, gíria, ou calão cinematográficos.
Uma longa‑metragem é um filme longo, um filme de longa duração, por acaso correspondente a uma fita longa, quando os fotogramas estavam gravados em fitas de celuloide. Uma curta‑metragem é um filme curto, um filme de curta duração, uma fita curta. (Há definições técnicas para estas expressões!)
Hoje já não são usadas fitas de celuloide, fitas que podiam ser medidas (a metro, em metros). Hoje, os suportes (físicos) dos registos das estórias cinematográficas já não são fitas de celuloide (onde, sem quaisquer ajudas óticas, poderíamos ver todos os fotogramas), medidas a metro (e porque não em jardas, como seria de esperar pelo maior desenvolvimento que os anglo‑saxónicos deram ao cinema?). Hoje, a expressão “longa‑metragem”, aplicada a filmes, não faz sentido literal**, só sentido figurado, embora, aparentemente, a referência seja agora o tempo e não o comprimento.
Entre nós, também são correntes palavras como, voltagem e amperagem, por exemplo. Mas também, gramagem – peso em gramas por metro quadrado de papel, entre outros –, tonelagem e litragem.
Na Metrologia estão incluídas medidas e medições a metro, polegada, litro, milha, ou libra (unidade de massa, ou peso), por exemplo.
Qualquer que seja o sistema de medições e medidas, com metro ou sem metro, integrará a Metrologia*** – um ramo científico, tecnológico e do conhecimento. Mesmo que o sistema metrológico não inclua o metro, como o designado “sistema inglês”, está integrado na Metrologia e nunca, por exemplo, brincando, na Polegadologia (de “polegada”).
*O metro, unidade de comprimento, nasceu, metrológica e oficialmente, em 22 de junho de 1799, quando o primeiro protótipo foi depositado nos Arquivos da República, em Paris. O começo da sua globalização ocorreu bastante mais tarde, nomeadamente, com a Convenção do Metro, que ocorreu em 1875, e onde participaram vários países (Portugal incluído) que oficializaram a sua adesão ao sistema metrológico nascente, o Sistema Métrico.
**Como não faz sentido literal falar de impressões quando falamos de documentos escritos, já que, na maior parte dos casos, não há impressão (pressão de tipos sobre o papel), mas aspersão de tinta sobre o papel ou outro suporte.
***“Metrologia” não é termo recente, tem origem em dois termos: um, metron, que significa medida, e outro, logos, que significa “estudo”, “ciência”, entre outros significados. “Metrologia” e “metro” têm a mesma raiz; “metro” não é a raiz de “Metrologia”.
Por vezes imaginamos o calor – uma forma de energia, energia em trânsito – como aquela entidade a que os antigos chamavam “calórico”, ora armazenado, ora transferido, como se fosse um gás, ou um líquido, um fluido ligado simultânea e intimamente à temperatura.
Mas, que coisa (grandeza) é a temperatura?
A temperatura é o que, comummente, se lê no termómetro, ou no pirómetro (quando as temperaturas são elevadas). Conhecemo‑la pelos seus efeitos.
A temperatura está definida, vulgarizada e banalizada, como estão banalizados a TV, o futebol, e a bondade de muitas outras coisas – que dúvidas poderá haver?
Boltzman [1844 – 1906] contribuiu para fundamentar cientificamente a (grandeza) “temperatura”, extraindo do conceito comum (macro) uma equivalência (micro) resultante do comportamento de átomos e moléculas.
A variação da temperatura de um corpo poderá ser a consequência da transferência de calor: um corpo poderá transferir calor – baixando a sua energia interna – diretamente para outro corpo, e, em princípio, arrefeceria; um corpo poderá receber calor diretamente de outro corpo, e, em princípio, aqueceria.
É mais fácil, simples e rápido medir a temperatura do que o calor!
Há termómetros para todas as ocasiões, circunstâncias e intensidades. E banalizadíssimos! Todavia, os calorímetros (os instrumentos de medir) são um pouco mais elaborados, desconhecidos e incomuns do que os termómetros.
Iguais quantidades de calorentregues ou fornecidas a corpos diferentes produzirão, em princípio, diferentes aumentos de temperatura. Tal como iguais quantidades de água vertidas ou vazadas em provetas de diferentes secções provocarão diferentes variações de altura (da água nas provetas).
O calor e a temperatura são grandezas associadas a muitos fenómenos: do atrito externo ao atrito interno; da combustão à iluminação; da radioatividade à cisão nuclear, entre outros.
Um calorímetro – um aparelho da categoria dos aparelhos de medir, um instrumento de medir as variações de energia térmica – serve para medir a quantidade de calor (trocado), em geral, a partir da medição da(s) temperatura(s).
Com frequência, medimos (diretamente) a(s) temperatura(s) e, a partir desta(s), calculamos, por exemplo, o calor, a energia térmica, a energia calorífica.
A unidade de temperatura (absoluta), o kelvin (símbolo, K), é uma das sete (7) unidades de base do SI; e a unidade de energia é o joule (símbolo, J, ou N∙m, newton‑metro, ou kg·m2s−2), embora por vezes se use a caloria (não‑SI, símbolo, cal; 1 cal≡4,1868 J)
Adicionar calor, implica, geralmente, a subida da temperatura (do recetor); e subtrair calor tem, em geral, como consequência, o abaixamento, ou a diminuição da temperatura (do dador). Contudo, nem sempre assim é: por exemplo, fornecer calor ao gelo poderá não fazer subir a sua temperatura. A entrega de calor poderá servir somente para a mudança de estado (físico), ou de fase da substância.
E quem diz mudança de estado sólido‑líquido, diz estado líquido‑gasoso, entre outras mudanças de estado.
*Há processos que podem ocorrer dentro dos corpos fazendo aumentar a sua temperatura: radioatividade, entre outros processos.
A Metrologia não se expressa só por números e por símbolos – maisuniversais, os do SI – mas também por palavras que não são universais, e são diferentes de língua para língua, que tendo em geral diferentes estruturas, regras e especificidades, não permitem uma interpretação uniforme, única e global das disposições normativas saídas dos órgãos do SI.
“s” é símbolo metrológico (SI) universal, mas o nome segundo (em português) escreve-se second, em inglês, secunde, em polaco, secundă, em romeno, por exemplo.
Por isso, algumas dúvidas, diferenças e ambiguidades, alegadamente em contexto metrológico, não são dúvidas metrológicas mas são, entre outras, dúvidas gramaticais.
Por exemplo, o que dizer da regra que indica que os prefixos SI (mili-. micro-, kilo-, entre muitos outros) são justapostos à designação da unidade sem outras alterações: milisegundo, micrometro, kilograma?
Estas três palavras são assinaladas pelo corretor ortográfico* instalado no dispositivo informático do autor como incorretas – correto seria: milissegundo**, micrómetro, quilograma.
Em português corrente, “milisegundo” lê-se como /milizegundo/; se escrevemos, por exemplo, “centímetro” e “milímetro”, com acento gráfico na antepenúltima sílaba (palavras esdrúxulas, ou proparoxítonas), porque escrever e dizer micrometro? E, até há pouco, “k” não constava do alfabeto português.
Dúvidas idênticas surgem, por exemplo, com miliradiano (em vez de milirradiano) e com nanosegundo (em vez de nanossegundo).
Noutra perspetiva, se, em português, o plural de “pardal” é “pardais”, por que razão o plural de “pascal” (um nome comum, embora Pascal seja nome próprio) deve ser “pascals”*** (corretor ortográfico assinalando erro!) e não “pascais”?
E “decibéis”?, grafado corrente e comummente como plural de “decibel”, como poderia ser grafado “decibels” (corretor ortográfico assinalando erro!), com prejuízo das regras gramaticais do português, mesmo em contexto metrológico?
E o que dizer, por exemplo, do plural de “bar”, “volt”?
O que dizer também da possibilidade de, nos títulos dos textos, todos os carateres serem maiúsculos. Por exemplo, mL (mililitro) poderia grafar‑se, num título, ML (megalitro)?!
*Todavia, nem tudo o que os corretores ortográficos digitais assinalam como erro são expressões erradas.
**Não haverá muitas línguas – se é que há alguma – em que juntar duas expressões (por exemplo, prefixo e termo base) obrigue a duplicar algumas consoantes, como no português a dobragem do “s” (sanha/assanhar) e do “r” (renda/arrendar), no meio da palavra?!
*** Por exemplo, em sueco, os plurais, em geral, não são formados acrescentando “s” ao singular de cada palavra.
“Aproximadamente” é uma palavra – um advérbio – muito frequente nas expressões, quer escritas, quer orais, relativas a medições e medidas.
Aproximadamente 2 kg; aproximadamente 5 L; aproximadamente 8 m e ainda, utilizando abusivamente o símbolo “±”, que soa como a expressão “mais ou menos”, por exemplo, ±500 g*, entre outras expressões do âmbito das medições, são expressões do tipo referido.
Qual é o diâmetro de um cabelo? Os cabelos humanos não são cilíndricos, nem têm todos a mesma espessura, mas dizer que é aproximadamente cem micrómetros (100 µm), um décimo de milímetro (0,1 mm), é uma boa indicação.
Todavia, ainda podemos ser rigorosos quando dizemos que uma determinada superfície é aproximadamente plana, se garantirmos que nenhum ponto dessa superfície se afasta mais do que, por exemplo, um milímetro (1 mm), aliás, milimetro, relativamente a um plano (virtual) de referência.
É costume dar como exemplo de uma superfície plana a superfície livre de um líquido em repouso. Contudo, qualquer superfície livre de um líquido, longe dos bordos, onde a tensão superficial produz deformações locais, acompanham a esfericidade da Terra (como os oceanos), todavia, as pequenas superfícies livres de um líquido em repouso são aproximadamente planas.
Quem diz superfície plana, diz superfície esférica, superfície cilíndrica, ou outra forma ou figura mais ou menos regular.
Tal como as superfícies das bolas de sabão – aquelas que frequentemente fazem parte das brincadeiras das crianças – não são esféricas, por causa da ação da gravidade, mas, são aproximadamente esféricas.
“Aproximadamente”, ou “aproximado”, poderá ser expressão usada em situações em que há rigor **.
Há até sinais matemáticos para expressões tais como:
aproximadamente: ≈
maior do que: >
menor do que: <
“Aproximadamente”, em áreas onde é necessário ser rigoroso, significa que o valor de que estamos a falar não difere do valor nominal, ou do valor de referência, mais do que uma quantidade previamente definida.
*A expressão “±500 g” – e, por vezes, +/–500 g – significa, por exemplo, em linguagem de supermercado, “aproximadamente quinhentos gramas”; em linguagem matemática significa que se trata do intervalo “–500 g a +500 g”, pese embora o facto de as massas, ou pesos negativos, não fazerem sentido físico corrente. Também é usado – na linguagem matemática – com o significado de que se trata de dois valores: –500 g, ou +500 g.
Contudo, em linguagem de supermercado, a expressão “±500 g”, e também
+/–500 g, em geral, destinar‑se‑á a preparar o cliente para aceitar menos do que 500 g.
**valor nominal
Valor arredondado ou aproximado duma grandeza característica dum instrumento de medição ou dum sistema de medição, o qual serve de guia para sua utilização apropriada. [VIM 2012] (Sublinhado do autor)
Há unidades metrológicas “desprestigiadas” na linguagem comum.
“Igual ao litro” é uma expressão idiomática portuguesa – sobretudo oral – para alguma circunstância insignificante, irrelevante, sem importância *.
Há expressões, com palavras da Metrologia, que nada têm a ver com a Metrologia. Todavia, o litro, uma unidade de medida, não é uma unidade SI embora seja aceite por este sistema.
“Igual ao litro”; “um minuto”, ou “um minutinho”; “ao milímetro”, entre outras expressões com aparente ligação à Metrologia, são expressões (mais ou menos) populares, idiomáticas, que não podem ser tomadas pelo seu “valor facial”, ou interpretadas literalmente.
“Igual ao litro” é uma expressão corrente para assunto, tema ou questão irrelevante, sem importância, ou indiferente, para quem usa a expressão.
Porém, igual ao litro, ou, metrologicamente equivalente ao litro, é o decímetro cúbico (dm3) – o volume de um cubo com uma aresta de um decímetro (1 dm).
O decímetro cúbico (dm3) – uma unidade de volume do sistema SI – é a milésima parte do metro cúbico (m3); o decímetro (dm) é a décima parte do metro.
As garrafas de água que compramos, ou nos servem nos restaurantes, têm capacidades expressas em litros, ou centilitros (1 cL=0,01 L).
Todavia, a água que retiramos das torneiras, em casa, é medida (e paga) ao metro cúbico (m3).
O litro começou por ser o volume ocupado por um quilograma (1 kg) de água pura, à pressão normal, e à temperatura de quatro graus Celsius (4 °C) **.
Há algumas dezenas de anos, o litro (L, l ***) foi feito equivalente ao decímetro cúbico (dm3): 1 L≡1 dm3 ****.
Todavia, não é comummente (comumente, em brasileiro) aceite expressar o volume de sólidos em litros. Também não é comum usar a unidade “litro” para representar medidas de exatidão elevada. O “litro” foi despromovido a unidade de capacidade de uso popular, na rua, no mercado, no restaurante.
*Já a expressão “dar o litro” significa realizar ou fazer (qualquer coisa) com muito empenho, muito esforço, e até auto superação.
**As incertezas, inexatidões e oscilações nos valores da “pressão normal”, da temperatura a que ocorre a máxima densidade da água e alguns padrões conduziam a uma grande dispersão de valores do litro em relação ao decímetro cúbico: 1 L=1,000027 dm3; ou 1,000974 dm3; ou 1,000028 dm3, entre outros valores!
Entre 1901 e 1964 o litro “valia” 1,000028 dm3. A partir de 1964, foi convencionado que “litro” seria um nome especial de um decímetro cúbico (1 dm3).
***Embora sejam aceites os dois símbolos, L e l, deve ser preferido o símbolo L por o símbolo l se poder confundir com o algarismo “1” (“um”); ora experimente o leitor os dois símbolos (l e 1) em modo ou tipo “Times New Roman”.
Por estas equivalências se percebe que o decímetro cúbico (dm3) não é muito prático para o dia‑a‑dia, por exemplo, na cozinha, à mesa do restaurante e no comércio das pequenas quantidades de líquidos. O litro (L) e seus (sub)múltiplos, sim. Quem é que já ouviu falar em garrafões de 5 dm3?