Um e vinte, expressão abreviada de, por exemplo, “um metro e vinte centímetros” (1 m 20 cm=1,20 m), e uma e vinte, expressão sucinta de “uma hora e vinte minutos” (1 h 20 min≈1,33 h), são expressões correntes, verbalmente idênticas, mas exprimem coisas muito diferentes! Quer pela natureza das grandezas – respetivamente “comprimento” e “tempo”, neste caso –, quer pelas unidades e submúltiplos das mesmas, por exemplo.
Na expressão “um e vinte” metro*, ou “um metro e vinte (centésimos do metro)”, 1,20 m, como alternativa a “um metro e vinte centímetros”, e na expressão horária “uma e vinte”, como alternativa mais breve à expressão “uma hora e vinte minutos” (1 h 20 min), “vinte” não tem o mesmo valorrelativo (metrológico) nas duas expressões.
Vinte centésimos do metro, vinte centímetros, são um quinto do metro (0,20 m=20/100 m=1/5 m); vinte minutos não são um quinto da hora, são um terço da hora [20 min=20∙min=20∙(h/60)=20/60∙h=1/3∙h=1/3 h]. 1/3 é maior do que 1/5!
Quem diz ume vinte (por exemplo, um metro e vinte centímetros), ou umae vinte (por exemplo, uma hora e vinte minutos), diz, entre outras expressões, “quatro e trinta” (quatro metros e trinta centímetros, 4,30 m), ou “quatro e trinta” (quatro horas e trinta minutos, 4 h 30 min), quatro horas e meia (hora), 4,5 h.
O minuto e a hora não são unidades de tempo do SI, embora sejam aceites pelo mesmo SI.
É provável que não fosse difícil adaptarmo-nos a expressões de tempo (com unidade estritamente SI) com o valor de, por exemplo, decassegundos (1 das=10 s), hectossegundos (1 hs=100 s=1 min 40 s) e quilossegundos (1 ks=1000 s=16 min 40 s), ou kilossegundos (grafia recomendada pelo VIM 2012). Mas, não, não estamos acostumados, ou rotinados para tais unidades e expressões.
Imagine que alguém lhe dizia ao telemóvel (celular, em brasileiro) – estarei aí dentro de dezoito hectossegundos (18 hs=1,8 ks). Assim, de repente, pareceria ser complicado até se perceber serem trinta minutos (18 hs=1800 s=30 min)**.
*Parece soar “mal”, mas, segundo o SI (Sistema Internacional de Unidades), só para valores iguais ou maiores do que dois de uma grandeza se poderia pôr a designação ou nome da unidade no plural: 0,5 m, meio metro, zero vírgula cinco metro; 1,8 m, um metro e oitenta, um vírgula oito metro; 2,4 m, dois vírgula quatro metros, dois metros e quatro decímetros.
A garrafa de “0,75 L” seria garrafa de “zero vírgula setenta e cinco litro”, sete decilitros e meio (7,5 dL), ou setenta e cinco centilitros (75 cL). Contudo, relativamente a esta expressão e outras semelhantes, parece não estar toda a gente de acordo, nomeadamente linguistas, dicionaristas e metrologistas.
Quanto ao plural do nome da unidade ser legítima só para valores de duas ou mais do que duas unidades parece ser uma polémica intra- e internacional! Apesar das indicações SI.
Já os símbolos SI das unidades não têm plural! Garrafa de três litros é “garrafa de 3 L”!
**18 hs=18∙100 s=1800 s=1800∙s=1800∙ (1/60 min)=1800/60 min=30 min
Medir ajuda a uniformizar, a banalizar, a democratizar.
Medir facilita as comparações.
Medir simplifica e clarifica processos, diminui ineficiências e reduz ambiguidades.
Camisas 40: um só tamanho, ou número, “veste bem” a uma quantidade enorme de pessoas. Apesar da necessidade, às vezes, de ajustes, ou ajustagens.
Medir ajuda e permite criar modelos que simplificam e embaratecem processos e baixam os custos dos produtos. E, muitas vezes, os preços.
Medir tudo é um processo longo, às vezes complexo, mas, seguramente, irreversível.
Medir é uma vertente basilar da nossa civilização.
Sapatos 41: um só tamanho, ou número de sapatos, serve a milhões de utentes. Apesar da necessidade (raramente) de uma ou outra correção.
Coisa idêntica sucede com quase toda a roupa, com muitos acessórios de usar com a roupa; e com muita comida.
Medir permite conhecer, perceber e ignorar as minudências, a insignificância e a irrelevância de muitas diferenças.
Medir torna o desempenho, as trocas e os negócios mais transparentes.
Medir promove a objetividade, a clareza, e melhora o conhecimento.
Medir clarifica o valor das coisas, diminui a ambiguidade das caraterísticas e diminui as assimetrias dos ganhos nas transações.
Medir reduz a arbitrariedade, aumenta o rigor, potencia a justeza.
Atipicamente, a expressão “à medida” não significa que o processo implique medições.
Quase ninguém calça ou veste à medida; a maioria usa pronto-a-vestir e pronto‑a‑calçar: é mais barato, mais rápido e mais democrático. E muitos já recorrem, ainda que com frequência condicionada, ao pronto‑a‑comer.
São necessárias grandes quantidades de dados resultantes de medições para construir modelos e constituir um reduzido número de tipos, de tamanhos, primeiramente racionalizados e seguidamente normalizados que servem a um grande número de pessoas.
O pronto‑a‑vestir é beneficiário das medições, muitas medições, medições criteriosas e interpretações adequadas das medidas. O pronto-a-calçar também.
E o pronto-a-comer segue um caminho idêntico. Porém, aparentemente, mais escrutinado.
Entretanto, o pronto-a-vestir, frequentemente, pode ser alvo de pequenos ajustes, ou ajustagens. Bem como o pronto‑a‑calçar. E até o pronto‑a‑comer, com os temperos a gosto.
Até os sonetos são poesia medida (metrificada) e uniformizada, de forma fixa: quatro estrofes; dois quartetos e dois tercetos; dez sílabas poéticas em cada verso.
A dor do poeta, real ou fingida, escolhido o molde-soneto, tem de caber neste fato, ou sapato!
Embora não seja novidade, começa também a ser muito frequente e a banalizar‑se, por exemplo, o pronto‑a‑acreditar, o pronto‑a‑pensar e o pronto‑a‑dizer.
As unidades de uma grandeza, em diferentes sistemas metrológicos, em geral não são coincidentes.
Entre outras unidades, o metro (SI) e a polegada (sistema inglês) são diferentes unidades para a grandeza comprimento, embora estes sistemas partilhem, por exemplo, a mesma unidade de tempo: o segundo (s).
Por vezes, mesmo dentro de um mesmo sistema metrológico, são usadas diferentes combinações das unidades de base para exprimir medidas da mesma grandeza.
A capacidade de um recipiente, geralmente expressa em litros (L), também pode ser medida em decímetros cúbicos (dm3).
Para medir a precipitação de chuva, poder-se-á usar o milímetro (mm), ou o litro (L). Na verdade, de acordo com o princípio metrológico dos pluviómetros (instrumentos para a medição da precipitação de chuva, ou depósitos graduados) mais comuns, quando se considera que a base para a recolha de chuva é uma superfície de um metro quadrado (1 m2), verifica-se que um litro (1 L) de água (ou outro líquido) espalhado naquela área conduz a uma camada de água de um milímetro de altura*. Por isso, dizer, por exemplo, cinco litros (5 L≡5 dm3) de precipitação em cada metro quadrado, equivale a dizer cinco milímetros (5 mm) de altura no pluviómetro.
A pressão arterial (humana, e não só) costuma ser expressa em cm Hg (centímetros de mercúrio)**, embora a unidade de pressão e de tensão corrente (SI), em Física, seja o pascal, símbolo, Pa, ou newton por metro quadrado (1 Pa=1 N/m2).
A unidade de temperatura do sistema SI é o kelvin (K), embora a (grandeza) temperatura seja frequentemente expressa em graus Celsius (ºC), sendo de notar que cada grau Celsius vale tanto como cada kelvin, embora a escala Kelvin não comporte valores negativos, ao contrário da escala Celsius.
A unidade de tempo do SI é o segundo (s), mas, o que é frequente é exprimirmos o tempo em horas (h) e minutos (min) – e segundos (s), às vezes – uma bateria de unidades na mesma expressão!
Também é frequente a densidade ser apresentada sem unidades, sob a forma adimensional – densidade relativa, aliás massa volúmica relativa –, ou com a unidade kg/m3 – densidade absoluta (densidade específica), aliás, massa volúmica. A densidade relativa tem a vantagem de ter o mesmo valor em todos os sistemas metrológicos, por representar a razão da massa volúmica de uma substância pela massa volúmica (geralmente) da água.
Para caraterizar o estado de alcoolemia de alguém, usa-se, quer a unidade g/L, gramas de álcool por litro de sangue (por exemplo, em Portugal) – embora no balão não entre sangue –, quer o mg/L, miligramas de álcool por litro de ar entrado no balão (bafômetro, em brasileiro).
A unidade de ângulo SI é o radiano, rad, embora correntemente os ângulos sejam expressos em graus (º), minutos de arco (′) e segundos de arco (′′).
*1 mm∙1m2=10−3 m∙m2=10−3 m3=(10−1 m)3=1 dm3≡1 L
**1 cm Hg com uma base de 1 cm2pesa (massa) 13,6 g (13,6 g/cm3), pesa
Em geral, começamos as contagens por “um” e iniciamos as medições por “zero”.
O relógio começa a medir, a contar, a partir de “zero” (0); o calendário começa a contar por “um” (1).
Se chamássemos “ano um” ao nosso primeiro ano de vida (na verdade, o nosso primeiro ano de vida é o “ano zero”), a mudança de década (um período de dez anos – decénio –, ou dez dias), da primeira década para a segunda década, só ocorreria da idade dos dez anos (10) para os onze anos (11) anos e não dos nove anos (9) para os dez (10) anos, como realmente sucede.
Olhando para o calendário: uma década (de dez dias), por exemplo, a primeira década de cada mês, começa no dia um (1) e termina no fim do dia dez (10), dos dez (10) para os onze (11) dias; a segunda década, no calendário, começa no dia onze (11) e termina no fim do dia vinte (20).
Entre nós, um bebé, durante os seus primeiros doze meses de vida, só tem meses, semanas e dias (ano zero); ao fim de doze meses dizemos que tem, ou faz, um ano. Quando chega a hora de passar dos nove anos (9) para os dez anos (10) ele faz o primeiro decénio (uma década)! E quando passa dos 99 anos aos 100, faz um século!
O calendário gregoriano, o nosso, aquele que parece ser seguido por toda a cristandade e alguns outros, não contempla o ano zero: o primeiro ano do calendário (gregoriano) é o ano um (1), alegadamente o ano do nascimento de Cristo. O calendário gregoriano consiste, praticamente, na contagem da idade que alegadamente teria Cristo que, diferentemente das outras pessoas (entre nós), não começa no ano zero, mas, no ano um!
Entre nós (a maior parte dos humanos), o primeiro ano de vida é o “ano zero”; segundo “o” calendário, o primeiro ano de vida de Cristo foi o “ano um”.
Percebe o leitor por que é que alguns celebraram a mudança de século e a mudança de milénio, do 2º milénio para o 3º milénio, em (31 de dezembro de) 1999, outros em (31 de dezembro de) 2000!? Muitos celebraram no fim 1999 e no fim de 2000 – duas vezes! Festa é festa! Mas, de 2000 para 2001 é que mudou o milénio! (E não foi uma imposição das redes sociais, por ser ainda demasiado cedo!)
As escalas ou graduações dos instrumentos de medição geralmente começam por “zero” (0): veja uma das suas réguas, caro leitor. Diferentemente, o calendário começa (a contar) por “um” (1).
Alguns instrumentos de medição têm escalas, para gamas dos valores das grandezas a medir, que não começam em zero. Por exemplo, alguns micrómetros* medem entre 25 mm e 50 mm; outros entre 50 mm e 75 mm; outros medem ainda entre outros intervalos, mas, ocorre com outros sistemas.
Sucede com pirómetros e muitos outros instrumentos. Até o termómetro clínico tradicional não tem escala ou graduação a começar em “zero”.
As escalas logarítmicas, como as que são usadas em alguns instrumentos, poderão começar (explicitamente) pelo número um (1), correspondendo (implicitamente) ao valor “zero” do logaritmo da expressão da medida, em qualquer base numérica (dez, dois, ou outra): 100=20=b0=1.
*Micrómetro (micrômetro, em brasileiro), em Metrologia, tanto significa submúltiplo do metro (µm, 10-6 m), como instrumento de medição de precisão, por exemplo, nas oficinas de manufatura metalomecânica.